dezembro 21, 2004

Comunistas aceitam ser psicografados?

A publicação de obras póstumas é um problema, sobretudo quando há abutres por perto — e eles sempre estão por perto quando se trata de “boa carne”. Na verdade, não há muito o que fazer para impedir o ataque, a não ser que as circunstâncias da morte permitam esconder o que se queira da família e dos editores. Mas aí a vaidade pode falar mais alto e da maneira mais melancólica possível, pois se apresenta na ausência. De qualquer modo, uma situação particular poderia ser resolvida por alguma espécie de decreto: a não-publicação de obras inacabadas, especialmente aquelas em curso.

Veja-se o caso do escritor ítalo-cubano Italo Calvino — morreu em 1985, antes de concluir a série de palestras que apresentaria em Harvard acerca da literatura que se deveria fazer. Escreveu cinco das ”Seis propostas para o próximo milênio”: leveza, rapidez, exatidão, visibilidade e multiplicidade. Faltou a mais decisiva: consistência. Mais decisiva, porque não escrita, é claro. Mas também porque serviria de contraponto a tudo o que ficou incompreendido da confluência entre as outras propostas e que tem servido de endosso à pior literatura, aquela que vaga entre o muito a falar e o nada a dizer. A incompletude levou à incompreensão; e a incompreensão ao tempo perdido de leitores e mais leitores. Talvez fosse o caso de psicografar alguma coisa. Mas Calvino era comunista de carteirinha.

7 Comments:

Blogger Alan said...

Non in solo pane vivit homo


O Renascimento trouxe o retrato da individualidade. O comunismo, através de figuras como Brecht, tenta instaurar a idéia da coletividade,como hegemonica. Desdenha dos heróis. Tenta mergulhar o mundo na Idade Média, desta vez sob o jugo da Igreja Marxista.

Leonardo Boff é médium?

1:45 PM  
Anonymous Anônimo said...

Se fosse proibido publicar obras póstumas inacabadas, Kafka seria mais um ilustre desconhecido...

Márcio Coelho

11:48 PM  
Blogger Bruno Rabin said...

Márcio Coelho, que honra tê-lo por aqui! Quanto ao Kafka, acho que o caso é diferente. Não eram obras inacabadas as suas. E, mesmo que fossem, o problema parece-me ser outro: o cara não queria publicar nada! Caso bem diferente do Calvino. Abração.

3:55 PM  
Anonymous Anônimo said...

Bom, o Castelo termina no meio de uma frase. E o Processo tem uma bela lacuna entre o "penúltimo" e o último capítulo. Mas vc tem razão quanto a ele não querer ver nada publicado. Ainda bem que o dinheiro falou mais alto e o editor dele botou tudo pra vender...

Márcio Coelho

4:07 PM  
Blogger Bruno Rabin said...

O Castelo é ruim; foi bom ter terminado sem acabar. (Brincadeira, hein, Márcio, mas o livro não é obra-prima, eu acho). Quanto ao editor, eu faria o mesmo.

4:13 PM  
Blogger david butter said...

Já falei isso lá no alto volta, mas repito aqui. O maior argumento contrário a essas obras é o seguinte: nenhum espírito suspirou uma errata no ouvido de um médium. Não acontece. Dá pra acreditar num negócio assim?

10:29 PM  
Blogger david butter said...

Sim, refiro-me às obras psicografadas.

10:30 PM  

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