Roberto ri por último
Roberto tem gestos largos e gargalhada fácil. Embora se ache dono da verdade, é um pouco ignorante e bem burro — mas tem gestos largos e gargalhada fácil.
Roberto gosta de definições, tanto mais radicais quanto mais ignorantes. A cada encontro com os amigos, uma nova — ou a repetição das velhas. Adora fazer comparações entre cineastas bons e cineastas brasileiros: “Cacá Diegues é o Fellini brasileiro,” repete sempre. Também costuma dizer que Manuel de Barros é um poeta genial. “Gente, ele é o Guimarães Rosa da poesia!” Quando fala de política, Roberto não deixa por menos: “O que o Brasil precisa é de um líder, o resto a gente resolve.” Para ele, “a única comida que presta é a italiana, e de cantina, que vem bem servida, porque, vocês sabem, comida é ingrediente, comida é ingrediente...” Os braços se abrem na frase, e depois de cada frase, a gargalhada fácil. Roberto ri fácil, e todos riem também.
Os amigos de Roberto gostam de falar mal dele em sua ausência; interpretam seu comportamento, relembram histórias, repetem sua ignorância. Não é difícil. Alguns já tinham tentado interceptá-lo ao vivo, durante a conversa. “Mas, Roberto, a idéia do filme é incomodar mesmo e fazer pensar.” Péssima estratégia, logo respondida com uma gargalhada franquíssima, seguida de um desdém preciso: “E você vai ao cinema para ficar incomodado?” E repetia a gargalhada, contagiando quem estivesse por perto.
Os amigos de velhos tempos já sabem disso e preferem calar, concordando com gentileza e se cutucando sob a mesa. Ali colhem material para o próximo encontro. Seu assunto preferido é Roberto. Alguns se perguntavam o que leva uma fraude como ele a ter uma namorada tão interessante. Outros trincam os dentes ao falar sobre seu sucesso como advogado. “Como é possível, o cara não consegue sustentar uma opinião?!” Há ainda os que duvidam de que ele seja tão idiota e imaginam estar diante de uma espécie de pegadinha... Mas todos concordam que, mais dia, menos dia, a fraude será descoberta. E riem risadas irregulares, cruzando os braços em gestos obtusos.
Roberto nem desconfia do que os amigos dizem sobre ele. Sempre os abraça largamente, prometendo aquela visita adiada, com a ressalva de sempre: “Mas vê se lê o Emir Sader, que o cara é gênio, hein!” E dá sua gargalhada aberta. Roberto não sabe, mas essa gargalhada é sua suprema ironia.
Roberto gosta de definições, tanto mais radicais quanto mais ignorantes. A cada encontro com os amigos, uma nova — ou a repetição das velhas. Adora fazer comparações entre cineastas bons e cineastas brasileiros: “Cacá Diegues é o Fellini brasileiro,” repete sempre. Também costuma dizer que Manuel de Barros é um poeta genial. “Gente, ele é o Guimarães Rosa da poesia!” Quando fala de política, Roberto não deixa por menos: “O que o Brasil precisa é de um líder, o resto a gente resolve.” Para ele, “a única comida que presta é a italiana, e de cantina, que vem bem servida, porque, vocês sabem, comida é ingrediente, comida é ingrediente...” Os braços se abrem na frase, e depois de cada frase, a gargalhada fácil. Roberto ri fácil, e todos riem também.
Os amigos de Roberto gostam de falar mal dele em sua ausência; interpretam seu comportamento, relembram histórias, repetem sua ignorância. Não é difícil. Alguns já tinham tentado interceptá-lo ao vivo, durante a conversa. “Mas, Roberto, a idéia do filme é incomodar mesmo e fazer pensar.” Péssima estratégia, logo respondida com uma gargalhada franquíssima, seguida de um desdém preciso: “E você vai ao cinema para ficar incomodado?” E repetia a gargalhada, contagiando quem estivesse por perto.
Os amigos de velhos tempos já sabem disso e preferem calar, concordando com gentileza e se cutucando sob a mesa. Ali colhem material para o próximo encontro. Seu assunto preferido é Roberto. Alguns se perguntavam o que leva uma fraude como ele a ter uma namorada tão interessante. Outros trincam os dentes ao falar sobre seu sucesso como advogado. “Como é possível, o cara não consegue sustentar uma opinião?!” Há ainda os que duvidam de que ele seja tão idiota e imaginam estar diante de uma espécie de pegadinha... Mas todos concordam que, mais dia, menos dia, a fraude será descoberta. E riem risadas irregulares, cruzando os braços em gestos obtusos.
Roberto nem desconfia do que os amigos dizem sobre ele. Sempre os abraça largamente, prometendo aquela visita adiada, com a ressalva de sempre: “Mas vê se lê o Emir Sader, que o cara é gênio, hein!” E dá sua gargalhada aberta. Roberto não sabe, mas essa gargalhada é sua suprema ironia.
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